Valentina Kallias
Estou de luto. Não porque perdi alguém querido. Estou de luto por mim, pelas perdas, pelos erros.
Desde o primeiro minuto em que desisti de quem eu sou para dar lugar ao que eu chamava de amor perfeito, eu morri. Morte lenta, ausente de qualquer sentimento afável sobre os quais o Drummond ou o Vinicius falariam com facilidade. Desaprendi a perdoar, a entender, a respeitar.
Antes a morte tivesse sido súbita, de um golpe só, dolorosa, rápida. Mas não. Ela chegou aos poucos. E avisou que estava por perto. Eu é que não quis perceber. Abandonei pedaços da minha vida por ausências injustificadas, atitudes egoístas, esperas, conversas inacabadas, encontros superficiais.
Sobrou o quê?
Um amontoado de retratos e cartões dentro de uma caixa de sapatos que enviei para ele ontem. Pelo correio. Pelo correio... Sabe o que isso significa? Eu sequer conseguiria olhar nos olhos dele. Choraria se fizesse.
A verdade é que quis morrer para tentar renascer. Acreditei que, se eu me acabasse ali, naquele falso-romance-diário, não sofreria mais. E fiz tudo como manda o manual. Eu pensava que a vida acontecia assim. Como se houvesse um manual! Fui até a última gota. Morri de amor. Abandonei sonhos, projetos, ideais. E perdi a parte bonita da vida. Esqueci como eu era. Quis agir e ser como o outro é. Não deu certo. Exagerei na dose.
Sozinha, desabei durante dois meses em pieguices e conversas melodramáticas com o terapeuta. Aprendi que o luto tem fases. E entendi eu estou na primeira. Falta um tanto para sair dessa. Preciso aceitar a morte de mim mesma.
Luto agora em outra conjugação. Luto, daqui em diante, para ganhar. Perder, não preciso mais.
Luto agora em outra conjugação. Luto, daqui em diante, para ganhar. Perder, não preciso mais.