Abril - outra vez

Laurent Pinsard


"...nos pasan tantas cosas en la vida
que si aparece el sol
hay que dejarlo pasar
abril otra vez
para que no tengamos soledad
... para que no tengamos nunca más soledad ."

[Fito Paez]

Vai ver é assim...

Howard David Johnson

Quem dera eu fosse mais forte, mais estanque, mais rude. Afinal, de que adianta a voz doce, o sorriso aberto, o cabelo solto, e o coração escorrendo? Quem sabe, no final, com esse meu jeito de menina boba, eu receba, de tudo, uns afagos, feito gato, e depois, esquecida a parte apressada do carinho, eu ganhe um canto na casa, na cama, ou no colo inquieto de quem me escolheu. Ter poesia na alma, hoje em dia, resulta em quê? Em versos escritos na folha de papel machê que você sequer vai saber o porquê de estarem ali? De que adianta ser boa, ser leve, ser só amor da cabeça aos pés se a alma é coisa que ninguém vê? Um dia me disseram que na vitrine dos corações de hoje se estampa outra coisa, que não isso que eu sou. Ingenuidade. Agora eu acho que entendi. As coisas da alma não estão à mostra. E raras são as coisas que se guardam assim, com tanto cuidado, como eu faço. O que se expõe hoje é outra coisa. O que fica ali, à venda, é moda. E moda passa. Como paixão. Não é amor. Pelo menos não o amor que eu busco. Não é. Mas vai ver é assim. De quase-amor em quase-querer, no tempo certo, o que é de verdade vem para mim. E me vê, inteira, como eu sou.




"Meu coração se perdeu no labirinto do querer
Ele não quer querer assim
Mas meu coração tem vontade própria e não
Me deixa andar eu deixo ir."
[ Stopa]

Agora, ouça bem!

Edoardo Pasero


Agora, ouça bem: eu escrevo - e falo - para a tua alma. São teus olhos os meus em dias de espera. São teus passos tudo o que sigo nestes meses de desassossego. Não é outro, não é nada. Não há nada. Só existe você. Em dias, noites, madrugadas. E mil outras noites. Sozinha. Sou poeta, é fato, mas tenho carne, osso, entranha, sexo. E sexto sentido. Não estranhe as minhas palavras, porque hoje elas querem estar, e entrar, em você. Eu avisei que nada me prende aqui, não avisei? Pois trate logo de me dar um trato ou, caso contrário, eu me mando sem você sentir. Hoje eu te espero. Amanhã, talvez. Mais adiante, o que há com você? Teu beijo é doce. E me encanta a poesia do teu olhar. Tua poesia em mim. E me basta. Por isso, não me perca por aí. Não se assuste. Não se ausente. Não me solte. Apenas me prenda, sempre, como se eu pudesse, num instante, fugir. Eu preciso, e só sei, amar assim.






[o que, em silêncio, por mim foi dito, para ti, nas primeiras horas da noite de ontem]

Muda o amor, muda o lugar

Louis Cantillo


Decidi. Vou mudar de casa, de telefone, de rotina. Ofereceram-me uma casa no campo. Daquelas grandes. Trezentos quilômetros daqui. Branca, janelas azuis, com alguns tijolos descascados. Flores e borboletas por todos os cantos. E um nascer do sol despontando no lago de águas cristalinas que é uma formosura. É, vou me mandar. Levo alguns livros, duas ou três garrafas de vinho - eu sei que lá encontro outras daquela safra boa de Tannat uruguaio -, meu gato Bóris, e alguns maços de cigarro, porque ninguém é de ferro [considerando o fato de passar trinta dias no meio do verde verdejante do sítio depois de ter terminado um namoro de dez anos]. Enfim, vou sair por aí, me perder, como dizem alguns, para poder me encontrar. Carro? Na garagem. Vou de ônibus. Cansei de dirigir e de cantar todo o repertório do Bowie alto e em bom som nos trajetos metropolitanos. Chegando naquela estação da cidadezinha pequena com casas coloridas que, agora, eu esqueci o nome, vou subir na jardineira amarela e adeus, bye bye, chego no sítio e só volto no começo de maio para a cidade de concreto. Do trabalho, tiro férias. Elas estão acumuladas há anos. Vou deixar para quem? Dane-se a responsabilidade laborativa por algumas semanas. Da academia, peço folga. Prefiro dez árvores seculares a dois corpos marombados. Não posso esquecer os incensos de baunilha e de pitanga, meus preferidos. Saias, vestidos e faixas de cabelo. Tudo em cores. Muitas. O patuá que eu ganhei de presente no último aniversário também vai. Quem me deu disse que traz sorte. E eu ando precisando dela. Aliás, não levo muita coisa além disso. O que eu preciso daqui em diante é silêncio, silêncio, si - lên - cio. E isso não inclui mais você.

Do meu jeito

Lara Jade Coton


Eu gosto, mesmo, é do exagero. E gosto da pressa porque a minha vida é urgente. Se preferir monotonia, você pode ligar a televisão. E apagar meu número de telefone. Para sempre. Pode continuar no cinza de tudo. Sem cor, sem amor. Tudo bem, talvez você não tenha entendido a segunda parte, quando eu disse que não gosto do tempo, dos sentimentos presos e das coisas estreitas, perfeitas demais. Quero beijar na chuva, na boca, no meio da rua. Ou na poltrona do cinema. Quero, e preciso, de tudo o que pulsa. Do impulso. E daquilo que me tira do sério, da linha, do eixo. Eu sei do meu tamanho. E sei que não brinco quando me atiro lá do alto, para os teus braços. Não brinco.

Fetiche

Brent Bergherm


Você. Assim, de boca, corpo, mão. Tudo. Em três noites. Quatro luas. Ou de quatro. No ato. Esse meu feitiço por você é uma coisa louca. Que dá água na boca do começo ao fim do dia. Sede dos teus beijos. Nas cores da seda, nos versos de Neruda ou com Janis na vitrola. Você vem. E me leva para perto até em pensamento. Não finjo. É fato. Falo. Fetiche de amor. Do mais puro de todos. Para toda a vida.






"[...] tão perto que se fecham teus olhos com meu sonho."
[Pablo Neruda]

Kiss me or leave me

Wytske Van De Kamp

Kiss me or
leave me
amor
de toda
a minha
vida.

Por falar nisso...


Eu nunca soube, exatamente, como se descobre o amor. Talvez porque, até aqui, esse meu jeito um tanto torto de desvendar as coisas tenha me atrapalhado. Ou, talvez, porque amor não foi feito para ser descoberto. Assim, com hora certa. Acho que é coisa que acontece sem dia que se marque no calendário. Não, o amor não deve ter tempo ou ser cronometrado e definido. Amor gosta é do infinito. Quem sabe o amor seja apenas uma brisa, daquelas de final de tarde de primavera. Ou flor de verão, que seja. No outono. Ou no inverno. É, enfim, amor. Apenas acontece.

em branco

e agora o que é
que eu faço?
você me aparece de novo
assim
como se fosse para
toda a vida.




Arte: S & R Rasheed

Gostos

Bogna Kuczerawy


Eu gosto da troca, do toque, e da mágica que há nos encontros. Não me interesso por maledicência, coisas sem graça, sem verbo, sem sentimento. Eu gosto do coração na boca. Dos cinco sentidos; e se houver outros eu gosto mais. Gosto dos mistérios, e não dos segredos. Gosto de gozar a vida. Em suavidade, movimento, sorriso e lágrima sincera. Eu gosto do olhar direto, do desejo liberto e do amar sem limites quando o limite é o amar. Eu gosto dos tipos sinceros, despidos das dores de outros amores. Eu gosto que me levem, leve, a caminhar nas estrelas. Eu gosto das invenções, inovações, dos enredos e dos suspiros apaixonados. Até de algumas confusões eu gosto. Das confusões de malícias, delícias e outros prazeres. Gosto das tempestades. E gosto das saudades que vêm. Gosto dos beijos delirantes, das palavras errantes, emocionadas. Gosto dos acasos bonitos e não dos descasos disfarçados. Gosto de tudo o que me faz bem. Gosto daquilo que me tem. Toda. E, de todo modo, eu ainda gosto muito de você.